Deserta, escura, silenciosa; diferente.

Mais uma tarde, igual a tantas outras.

Um vento frio corre lá fora.

A rua parece ter parado no tempo; deserta, escura, silenciosa, diferente do que outrora foi.

Cá dentro, a aparelhagem entrega-me melodias que enchem a minha casa. O telefone toca, esperando, em vão, alguém que ouça o seu chamamento. E eu, que me encontro deitada na cama, de cabeça para baixo, fixando a parede, tal e qual como faço nos momentos de tédio e/ou de preguiça, nada oiço.

Estou a desejar que o tempo pare; não me quero mexer, não quero ouvir nada, não quero dizer nada. Apenas quero continuar aqui, sozinha, a fixar o nada. Quieta, como se me custasse respirar. Mas não. Apenas não quero perder a linha dos meus pensamentos; não quero adormecer os meus neurónios. Quero saber até onde me podem levar, tudo o que posso descobrir. E continuo fixando o nada, que vai transportando-me para os lugares mais inimagináveis, levando-me a reviver os momentos mais surreais da minha vida: todas as frases que me magoaram, todos os silêncios que quebrei, todos os momentos que me preencheram, todos os momentos mergulhados naquele silêncio ensurdecedor que toda a gente sabe que eu odeio (...) não, não sou masoquista, mas os momentos menos bons continuam a fazer parte da minha história e contribuíram para enriquecer a pessoa que hoje sou.

E, depois de o telefone ter cessado, de a música ter parado, eu continuo fixando o nada. E é fixando o nada que percebo que não mudaria nada do meu passado e, muito menos, do meu presente.

Fixando o nada, só sei que continua a correr um vento frio lá fora e que a rua continua tal como eu outrora estive: fria, deserta, escura, silenciosa. Mas, agora, simplesmente já não tenho tempo para o silêncio.

E, apesar de estar diferente, continuo igual. Igual a mim, numa tarde igual a tantas outras.